Especialistas discutem aumento da mediação

A mediação no Brasil já atingiu um patamar razoável mas tem muito a percorrer para se tornar uma solução alternativa de conflitos concreta aos conturbados sistemas processuais. O principal empecilho é a fraca cultura mediadora da comunidade jurídica do país. A análise foi feita ontem por autoridades no assunto em uma conferência internacional organizada pelo Ministério da Justiça e pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).O presidente do Conselho Nacional de Mediação e Arbitragem (Conima), Adolfo Braga Neto, mostrou a evolução no número de entidades que procuram intermediar conflitos. Em 1997, o país tinha 18 instituições. Hoje são 77. Ele demonstrou também o grande aumento de arbitragens feitas. Essa categoria de solução de conflitos observou um salto de 2.328 em 1999 para 3.375 em 2004. "É importante destacar que a maioria se deu no âmbito da Justiça trabalhista", explicou Braga Neto.O presidente da Conima destaca a diferença básica entre a mediação e a conciliação, dois dispositivos muito confundidos pela sociedade. "A conciliação ocorre em uma audiência, envolve casos e processos, e na mediação as pessoas precisam de tempo para pensar, refletir", disse. "A mediação é para quem quer uma solução pacificada, não é uma panacéia para desafogar o Judiciário."Essa mentalidade de tratar a mediação como um desafogo sem pensar no ponto de vista das partes ainda faz parte do pensamento de juízes e advogados. A opinião é do desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) Kazuo Watanabe. "Ainda vivemos a cultura da sentença em vez da cultura da pacificação", disse o ex-magistrado. Com o abarrotamento da corte estadual paulista, é "muito mais fácil terminar o processo com uma sentença do que com a pacificação das partes". Embora os dois projetos de mediação do TJSP tenham sido bem-sucedidos, Watanabe diz que "o acordo está sendo feito para acabar com o processo e não para solucionar o conflito".André Gomma Azevedo, juiz do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) e coordenador do Grupo de Trabalho da Universidade de Brasília sobre mediação, também criticou a mentalidade da comunidade jurídica. "Cria-se a ficção de que uma sentença pacifica o conflito, mas para a parte não interessa a relação jurídica, mas a relação social", disse o magistrado. Ele lembra da necessidade de se mudar o paradigma. "Nesse caso, não é problema processual, mas de perspectiva. Muitos só vêem o que é do direito, sem observar o lado do jurisdicionado", disse.Antes do debate sobre mediação, Enrique Andrés Font, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Rosário, na Argentina, apresentou um bem-sucedido programa de mediação adotado no país. São criados foros comunitários para a solução dos conflitos. "O grande foco é o pedido de desculpas e o sentimento recíproco entre as partes", explicou. (Valor Econômico)