Um seguro pouco conhecido

Muitos brasileiros, na maioria donos de carros mais velhos, não pagam DPVAT. Deveriam. Ele banca a indenização da maioria das vítimas de acidentes.

Todo mundo deveria pagar o DPVAT, o seguro obrigatório de veículos, que vem junto com o IPVA para ser quitado em janeiro de cada ano.

Infelizmente, esta não é a regra. Milhares de brasileiros, na maioria proprietários de carros mais velhos, não pagam nem o imposto, nem o seguro. O resultado é uma arrecadação menor, que não tem a contrapartida do lado dos sinistros. Estes continuam subindo, o que está absolutamente de acordo com a realidade nacional, no momento em que a frota circulando pelas ruas e estradas bate recorde atrás de recorde.

O DPVAT este ano teve um aumento de preço bem acima da inflação, sem que houvesse a correspondente elevação dos valores das indenizações. O duro é que o mecanismo está correto.
A imensa maioria dos seguros se baseia num princípio chamado mutualismo, que é a constituição de um grande fundo, composto pelos prêmios pagos pelos segurados e administrado pela seguradora, com a função básica de pagar as indenizações dos sinistros cobertos e as demais despesas decorrentes da operação.

No caso do DPVAT, apenas 44% do total do faturamento é destinado ao pagamento das vítimas dos acidentes de trânsito. 45% são repassados ao SUS, por força de lei, o que torna inútil a discussão. 5% são encaminhados aos DENATRAN para investir em programas de prevenção de acidentes e educação no trânsito. 4% cobrem os encargos operacionais. E 2% é a margem de resultado das seguradoras.
Ao longo de 2010 a Seguradora Líder do Consórcio DPVAT destinou R$ 2,29 bilhões de reais para pagar sinistros. Este número representou um aumento de R$ 261 milhões de reais, ou praticamente 10%, em relação a 2009.

Em função da destinação do faturamento do seguro, para que as indenizações possam continuar sendo pagas, sem afetar o mútuo, era necessário o reajuste dos preços do seguro, especialmente para automóveis e motos.

O valor atual da indenização por morte é de R$ 13,5 reais. Para alguém da classe média alta, pode parecer pouco, mas para a imensa maioria dos brasileiros é mais de 12 vezes o salário mensal, ou mais ou menos 24 vezes o valor pretendido pelo governo para o novo salário mínimo. Vale lembrar que o seguro de vida dado pelas empresas para seus funcionários normalmente mantém este patamar como valor das indenizações.

Então, não é verdade que a indenização do DPVAT é baixa. Por outro lado, é verdade que seu preço é relativamente alto, mas as razões para isso estão explicadas acima.

O que é apavorante é a ordem de grandeza das vítimas do trânsito brasileiro e mais apavorante ainda, a curva de acidentados. Em 2010 o seguro pagou 50.780 indenizações por morte. Como nem todos buscam esta indenização, não é exagerado dizer que o Brasil tem anualmente perto de 60 mil mortes causadas pelo trânsito. Além delas, foram pagas 151.558 indenizações por invalidez permanente e 50 mil reembolsos de despesas médico-hospitalares.

Em outras palavras, o trânsito nacional, com 252 mil indenizações pagas pelo seguro obrigatório, a imensa maioria por morte e invalidez permanente, é uma das mais eficientes máquinas de ceifar vidas e destruir sonhos à disposição da sociedade.

Mas ainda há mais um dado trágico. As motocicletas representam apenas 26,4% da frota nacional. Todavia, mais de 60% das indenizações do DPVAT foram pagas para vítimas de acidentes envolvendo motos. E mais de 68% das pessoas que receberam indenização por invalidez permanente estavam envolvidas neste tipo de evento. Nos acidentes de moto, praticamente 70% das vítimas são os próprios motociclistas, mas não necessariamente os motoboys.

Como se vê, o quadro do trânsito nacional, com base na radiografia dos números pagos pelo seguro encarregado de minimizar as perdas e o sofrimento das vítimas e seus dependentes, é dramático. O mais cruel é que a curva é ascendente. Sem investimentos sérios na qualidade das ruas e estradas, na fiscalização e, acima de tudo, na educação da população o Brasil manterá por muitos anos o título de um dos campeões mundiais de vítimas de trânsito.

Fonte: O Estado de S.Paulo/ Por: Antonio Penteado Mendonça