Portabilidade na previdência privada

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Autor: Karla Spotorno - 19/02/13
Fonte:Valor Econômico


Eles ainda são poucos, mas já são mais numerosos. No ano passado, o número de investidores que fizeram a portabilidade de seus planos de previdência privada aumentou mais de 22%. Foram 57,7 mil clientes que decidiram migrar seus recursos para outra seguradora ou mesmo entre fundos de previdência da mesma companhia. Em valores, movimentaram quase R$ 5,7 bilhões, 48% a mais do que em 2011. Os motivos para a migração são diversos. Quando decidiu portar suas reservas, a consultora em gestão de pessoas Gabriela Tierno levou em consideração o descontentamento com a seguradora à qual confiou suas economias por anos. Sem sucesso em sua tentativa de ser melhor atendida, Gabriela não teve dúvidas: fez a portabilidade e hoje é cliente de outras duas seguradoras. "[Portar os recursos da previdência] é um direito do cliente. No meu caso, foi minha melhor decisão", diz a consultora.

A decisão de Gabriela e de milhares de participantes deu à portabilidade um resultado sem precedentes em 2012. O crescimento do valor portado e do número de portadores no ano passado nunca foi tão grande (veja os dados nesta página). A estatística, entretanto, merece ser relativizada e analisada sob diferentes pontos de vista. O primeiro é o fato de os PGBLs e os VGBLs serem a única aplicação financeira com incidência de Imposto de Renda (IR) que permite a mudança de investimento e a migração entre empresas sem recolhimento do tributo. A mesma facilidade não existe nos fundos de investimento. Neste último produto, o cotista precisa resgatar o valor e recolher o imposto devido. Ao portar, o participante da previdência privada também não sofre nenhuma perda quanto à contagem do tempo com vistas ao IR. Esse é um detalhe importante para o cliente que optou pela tabela regressiva, pela qual a alíquota cai a 10% quando a poupança ultrapassa os 10 anos. "Acredito que muitas pessoas não sabem disso e deixam de fazer a portabilidade", diz Leticia Camargo, planejadora financeira (CFP).

Outro ponto é que, mesmo tendo crescido bastante, o número de participantes que portaram em 2012 ainda é muito pequeno quando confrontado com o total de clientes desse setor. Não chega a 0,5% dos 12 milhões de participantes. Diante do total de provisões (recursos), o valor portado também é pequeno - apesar de crescente, como mostra o cálculo feito pela Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi). Em 2012, os participantes portaram o equivalente a 1,75% do volume total. Um ano antes, 1,5%.

O fato de, proporcionalmente, poucas pessoas tomarem a mesma decisão de Gabriela não parece encontrar uma justificativa na plena satisfação dos participantes com a rentabilidade de seus fundos. Como mostrou reportagem do Valor em janeiro, o retorno médio da maioria dos segmentos da previdência privada em 2012 excedeu por pouco ou nem conseguiu superar o CDI, referencial do mercado financeiro para as aplicações mais conservadoras e de curto prazo. "Os resultados são ruins há muito tempo. Fala-se em flexibilizar as regras [leia mais abaixo], em aumentar a parcela de renda variável. Acho que é preciso, antes, fazer o básico: melhorar a rentabilidade", afirma Marcelo Nazareth, sócio-diretor da consultoria NetQuant, co-responsável pelo levantamento sobre rentabilidade.

Sérgio Prates Nogueira, superintendente comercial de previdência da Icatu Seguros, acredita que a portabilidade crescerá mais neste ano. Os motivos são a busca por melhores rentabilidades e a maior eficiência do mercado na transferência dos recursos. "Antigamente, alguns processos levavam meses para serem concluídos. Agora, são dias. Se demora muito, a seguradora é multada", afirma o executivo da Icatu, que teve 35% de sua captação originada pela portabilidade. O prazo regulamentar para conclusão da transferência dos recursos é de cinco dias úteis, segundo determinação do órgão regulador, a Superintendência de Seguros Privados (Susep).

Para a Mafpre, a portabilidade funciona, praticamente, como um aliado comercial. "É um vetor importante para o nosso faturamento", afirma Maristela Gorayb, diretora de Previdência da Mapfre Serviços Financeiros. Mais de 50% da captação da empresa em 2012 veio de recursos portados por clientes de outras seguradoras.

O rol de facilidades para portar os recursos na previdência privada não deve ser entendido pelo investidor como uma possibilidade totalmente livre de desvantagens. Ao portar, o participante terá de concordar com as condições do novo plano e do fundo no qual vai investir. Além de perguntar quais as taxas de administração e de carregamento que terá de pagar, o investidor deve prestar atenção a detalhes mais técnicos. O primeiro é a tábua atuarial. Caso venha a usufruir da renda vitalícia ao se aposentar, o investidor vai sentir no bolso a diferença entre a tábua atuarial brasileira, a BR-EMS, e a AT-2000, comumente usada há três anos. Em uma simulação feita pela Icatu Seguros, a diferença é relevante. Pela tabela brasileira, a renda de um aposentado de 65 anos e uma reserva de R$ 1 milhão seria de R$ 3.901,05 por mês. Pela AT-2000, ficaria em R$ 4.272,63.

Outro detalhe é a taxa de juros a ser aplicada no período de recebimento do benefício. Se o seu contrato atual promete rentabilizar a reserva acumulada em 6% ao ano, é melhor refletir mais sobre a portabilidade. A maioria das seguradoras oferece contratos sem devolver nenhuma rentabilidade ao participante depois de converter os recursos em renda vitalícia. Quem portou e não gostou, não pode simplesmente reverter a operação, mas é possível fazer uma nova portabilidade. Segundo a Fenaprevi, o intervalo mínimo entre os pedidos é de 60 dias.

Fonte: FenaPrevi