A importância das boas escolhas

Ou isso ou aquilo - Cecília Meireles

“Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...
e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranquilo.

Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.”

Dedico-me profissionalmente à educação financeira há mais de dez anos, depois de ter trabalhado mais de vinte anos no sistema financeiro. Os anos de estudos melhor nem comentar, para que o leitor não comece a fazer contas. Até porque não acabaram.

E o assunto de hoje é esse: a não necessidade de fazer contas para colocar em prática bons hábitos, posturas e atitudes consideradas adequadas pela ótica da educação financeira. Quem se escondia atrás dessa desculpa, melhor buscar outra.

Há muito tempo percebi que para a grande maioria da população não são necessários conhecimentos matemáticos ou financeiros para gerir as finanças pessoais, nem mesmo para progredir financeiramente. Das poucas contas simples as serem feitas uma é realmente importante: gastar menos do que se ganha. As demais, ficando no linguajar do consumo consciente, são supérfluas. Percebi isso numa fase da minha vida profissional que havia na minha equipe colaboradores inteligentes, com formação acadêmica invejável, incluindo economistas, matemáticos, estatísticos, especialistas, mestres e doutores nessas áreas de conhecimento. Mas adivinhem! Alguns deles enrolados com as próprias contas. Operadores experientes de mesas de câmbio ou no mercado de ações ou de títulos, mas que sequer fechavam o mês sem entrar no cheque especial. Investimentos pessoais? Como, se não conseguiam juntar capital?

Nas mesas, para os outros, faziam negociações de milhões, brigando por taxas anuais ou preços na quarta casa decimal. Nas finanças pessoais pagando juros de dois dígitos ao mês no cheque especial.

Decididamente não era conhecimento que lhes faltava, ou ainda falta, já que essa situação, para a maioria, deve continuar corrente.

No outro extremo, ainda hoje me lembro de uma empregada doméstica que a partir do dia em que se aposentou, e passou a receber do INSS, ficou três anos sem tocar em um centavo daquele dinheiro, para realizar seu objetivo. Como ela mesma dizia: “Até hoje vivi sem esse dinheiro, apenas do meu salário e das minhas faxinas. Posso continuar assim...”. Três anos depois ela se livrou do aluguel para o resto da vida.

Nas minhas andanças e palestras pelo país trabalho com diversos públicos, humildes, de comunidades carentes, a outros privilegiados, de famílias multimilionárias; de grandes empresas com operários e executivos, a chão de fábrica e, em muitas das vezes, em ambiente escolar, nas capitais e no interior, no campo e na cidade, em escolas públicas e privadas. Noto com clareza, nos olhos de algumas crianças ou nas perguntas de alguns professores, quem já percebeu a diferença entre ser passivo ou ativo na própria vida.

Vejo gente acreditar em autores que escrevem sobre educação dos filhos, sem que tenham tido o privilégio de serem pais, ou que ensinam o caminho do primeiro milhão, sem terem sequer acumulado os primeiros milhares.

Não é a quantidade de livros sobre finanças pessoais que cada um ler que vai fazer a diferença. Talvez a qualidade. Mas com certeza a variedade. Encerro este artigo com três dicas de leitura absolutamente diversificadas. Primeiro, o clássico das finanças pessoais, leitura obrigatória, para embaralhar as ideias e questionar o feijão com arroz da visão contábil das finanças: Pai Rico, Pai Pobre, de Robert Kiyosaki. Segundo, um inusitado: A menina, o cofrinho e a vovó, de Cora Coralina. Sim, daquela velhinha doce, do interior de Goiás, do alto de sua simplicidade e vivência. Por fim um poema que venho utilizando como ferramenta nas minhas consultorias há muitos anos: Ou isto ou aquilo, de Cecília Meireles.

“Ou guardo dinheiro e não compro o doce, ou compro o doce e gasto o dinheiro.”

O último trata basicamente de escolhas, não necessariamente relacionadas a dinheiro. É uma escolha diferente de abordagem. Uma poesia como “Ou isto ou aquilo” nos ensina mais do que o uso de um bloquinho para anotar despesas ou qualquer cursinho de home-broker ou de controle do orçamento doméstico. Boas escolhas! Essa é uma das chaves do sucesso financeiro.

Fonte: CNseg