Entenda o impacto das emancipações municipais


Bombinhas é uma das cidades catarinenses emancipadas entre 1991 e 2000. A região fazia
parte do município de Porto Belo (Foto: Divulgação)


Santa Catarina conta com 295 municípios. Desses, 76 foram criados entre 1991 e 2000, e outros dois em 2012, a partir de cidades já existentes no território catarinense. Esse número é apresentado em uma pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgada na edição de dezembro da revista Exame. O estudo apresenta a razão pela qual há a procura pela emancipação municipal e os problemas vinculados às pequenas cidades.

Os 78 municípios emancipados representam 26,4% das cidades catarinenses. Juntos, esses municípios somam 313.289 mil pessoas. Esse número corresponde a 5,01% da população total de Santa Catarina.

Para ver a lista dos municípios emancipados em Santa Catarina entre 1991 e 2000, clique aqui.

De acordo com a pesquisa, entre os 1.018 municípios instalados entre 1991 e 2000, apenas 40 possuíam mais de 20 mil habitantes. O movimento de emancipação de municípios alterou a distribuição das cidades por tamanhos da população e por regiões. Enquanto em 1940 apenas 2% dos municípios possuíam menos de cinco mil habitantes e 54,5% menos de 20 mil habitantes, em 2000 esses números passaram para 24,10% e 72,94%, respectivamente, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE).

Recentemente, a presidente Dilma Roussef vetou um projeto de lei que permitiria levar adiante processos que resultariam na criação de 190 novos municípios. Desse número, seis projetos são de regiões de Santa Catarina. A justificativa: preservar as finanças públicas dos efeitos de uma onda de emancipações. De acordo com a pesquisa, Dilma está certa. Cidades com menos de 10 mil habitantes pagam caro para prestar serviços públicos como saúde, educação e segurança e manter o patrimônio necessário para atender a população. Nessas localidades, os custos per capita só são menores do que os de metrópoles como Rio de Janeiro e São Paulo. Outro problema é que, quanto menor o município, maior a dependência de recursos federais para fechar o orçamento.

Em Santa Catarina, além das 76 cidades criadas até o ano 2000, outros dois municípios se emanciparam depois desse período. De acordo com a Assembleia Legislativa do Estado, Pescaria Brava e Balneário Rincão elegeram, inclusive, prefeito e vereadores na última eleição municipal, em 2012.

Porque os municípios querem emancipar-se

Atualmente, há no país 814 bairros e distritos querendo se emancipar. Vários estudos foram realizados na década de 1990 para tentar entender os principais motivos. Bremaeker (1993) realizou sua pesquisa mediante o envio de questionários abertos aos prefeitos dos novos municípios em 1992. Ele obteve 72 respostas, que representavam uma amostra de 12,4% do total. As principais alegações fora:

54,2% descaso por parte da administração do município de origem;

23,6% existência de forte atividade econômica local;

20,8% grande extensão territorial do município de origem;

1,4% aumento da população local

O Instituto Brasileiro de Administração Municipal (Ibam) divulgou, na sua Revista de Administração Municipal, os resultados de uma pesquisa em que se procurou identificar – perguntando diretamente aos novos prefeitos – quais os motivos que levam à criação do município. A resposta mais freqüente foi a alegação de “descaso por parte da administração do município de origem”, apontada por 62,9% dos prefeitos dos novos municípios.

Outro incentivo à emancipação vem dos mecanismos de repartição do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), que favorecem as cidades menores. Esse fundo é repartido pelo seguinte critério:

10% são divididos entre as capitais dos Estados com base na população e no inverso da renda per capita;

90% são divididos entre os municípios que não são capitais. Destes, 96% são divididos com base na população do município.

O grande problema das pequenas cidades

Os pequenos municípios dependem fortemente das transferências de impostos. O sistema de transferências constitucionais cria vínculos de dependência que afetam as finanças municipais. Qualquer problema econômico na esfera federal ou estadual que reduza as respectivas arrecadações repercute nas transferências municipais e faz com que os municípios deixem de receber componentes essenciais dos seus orçamentos. Como a maioria, senão a quase totalidade, das despesas municipais é inflexível, a conseqüência é o desequilíbrio das finanças locais, o déficit de execução orçamentária e o déficit financeiro.

A pesquisa do Ipea mostra que, em 1996, a participação das receitas próprias na receita total corrente dos municípios brasileiros de até 5 mil habitantes era de apenas 9%, número ainda menor no caso dos municípios do Norte e Nordeste: 2,9% e 4,4%, respectivamente. Essa participação, no entanto, aumenta continuamente com o aumento das populações municipais. Por exemplo: municípios com mais de um milhão de habitantes tinham receitas próprias equivalentes a quase 56% de suas receitas correntes totais. Ou seja: para custear suas despesas, inclusive da própria administração, os pequenos municípios dependem fortemente das transferências de impostos, especialmente dos impostos federais, via Fundo de Participação dos Municípios (FPM), que são gerados principalmente por municípios mais populosos.

Outro aspecto apresentado no estudo é que os municípios com mais de um milhão de habitantes de todas as regiões do Brasil e os municípios do Sudeste e Sul com mais de cem mil habitantes são financiadores líquidos, via FPM, dos demais municípios brasileiros. O mecanismo de repasse do FPM também faz que os municípios muito pequenos, especialmente com até 5 mil habitantes, em praticamente todos os casos, disponham de mais recursos financeiros per capita do que quaisquer outros, exceto os municípios com mais de um milhão de habitantes do Sudeste.

Impactos da criação de novos municípios nas contas públicas

A transferência de receitas tributárias originadas nos municípios grandes para os municípios pequenos reduz a capacidade das prefeituras das grandes cidades em realizar programas sociais e suprir serviços, como transporte, saneamento, segurança e pesquisa básica, o que reduz, por conseqüência, os incentivos à produção. Por outro lado, como a maior parte dos recursos recebidos pelos novos municípios destina-se a gastos de pessoal, essa nova alocação de receitas provavelmente não estimula, na mesma proporção, a produção nos municípios pequenos.

De acordo com a pesquisa, os benefícios diretos da criação de municípios atingem uma pequena parte (não necessariamente a mais pobre) da população brasileira que vive nos pequenos municípios, mas prejudica a maior parte da mesma população, que habita os outros municípios, onde os recursos se tornaram mais escassos.

Ponto de vista

Levando em consideração a eficiência no uso dos recursos públicos, permitir que pequenos bairros e distritos sem unam e, com isso, se emancipem, seria a alternativa mais viável. Contudo, esse tipo de proposta dificilmente conseguiria ser levada a diante no Brasil devido à pressão política para uma solução nesse sentido. A saída, levando em conta os dados da pesquisa, seria incentivar a formação de consórcios entre cidades pequenas. Elas poderiam se unir para compartilhar investimentos e dividir as despesas com a prestação de serviços.  

Fonte: Noticenter