O impacto das fake news nas eleições presidenciais

As “fake News”, ou notícias falsas, têm mais aderência entre eleitores com posicionamento políticos mais extremados. Esta é uma das conclusões da pesquisa empreendida por Brendan Nyhan (Dartmouth College), Andrew Guess (Princeton University) e Jason Reifler (University of Exeter) buscando avaliar os impactos das “fake news” na campanha presidencial americana que levou Donald Trump ao poder.

No artigo “Selective Exposure to Misinformation: Evidence from the consumption of fake news during the 2016 U.S. presidential campaign”, publicado em janeiro de 2018, os pesquisadores afirmam ainda que 65% das visitas a sites de fake news vinha de um mesmo grupo, composto por 10% dos eleitores identificados como mais conservadores.

Para chegarem a essas conclusões, eles usaram uma ferramenta para registrar os sites visitados, entre 7 de outubro e 14 de novembro de 2016 (durante a campanha e uma semana depois da votação), por 2.525 eleitores americanos acima de 18 anos, que autorizaram ter sua navegação monitorada de forma anônima. Além do acompanhamento da navegação, os eleitores foram submetidos a um questionário para identificar suas preferências eleitorais.

A partir dos resultados, foi observado que 27% dos eleitores leu pelo menos uma notícia falsa no período analisado e que estas representaram 2,6% de todos os textos lidos em sites noticiosos (incluindo os veículos tradicionais), sendo a maioria dos textos falsos “esmagadoramente pró-Trump”. Das 5,45 notícias falsas lidas, em média, por leitores de fake News durante o período, 5 eram identificadas como favoráveis ao republicano.

Assim, não surpreendentemente, os eleitores pró-Trump eram três vezes mais propensos a visitar sites de fake News do que aqueles que se declaravam pró-Hillary. Eleitores acima de 60 anos de idade também eram mais inclinados a visitar esse tipo de página.

A pesquisa indicou ainda que 25,3% das pessoas do grupo estudado leram ao menos um texto elaborado por sites dedicados a verificar a veracidade das informações publicadas por sites noticioso, mas os números sugerem que o consumo de checagens acaba concentrado justamente entre os leitores que não leem fake News assiduamente.

“Mais importante ainda é que nenhum dos entrevistados que leu um ou mais artigos de notícias falsas viu a checagem que desacreditava aquela informação”

Apesar de os pesquisadores não poderem afirmar que as fake news influenciaram de forma efetiva o resultado das eleições americanas, visto que apenas cerca de 10% dos eleitores são consumidores mais frequentes dessas notícias falsas, eles não desconsideram o potencial de disseminação dessas notícias e os danos que elas podem causar à qualidade do debate político.

“A exposição seletiva a informações erradas e o efeito provocado pela repetição massiva destas, induzindo à sua aceitação, dizem eles, reforçam a urgência do debate sobre características inerentes às redes sociais, visto que esses leitores de fake news podem impulsionar alegações fabricadas de suas ‘câmaras de eco’ para uma visibilidade generalizada, potencialmente intensificando a polarização e o efeito negativo para candidatos opostos”, afirmam.

Cabe ainda destacar que a pesquisa examinou somente o consumo de fake news a partir da visita aos sites por meio de notebooks ou desktops. Não foram verificados, portanto, o consumo dessas notícias por meio de smartphones, por exemplo, nem diretamente nas redes sociais. Circunstâncias que, sugerem os próprios pesquisadores, merecem ser tema de estudos futuros.

No Brasil, o candidato de perfil mais conservador, capaz de atrair eleitores com posicionamento políticos mais extremados,  é o ex-militar e evangélico Jair Bolsonaro que, teoricamente, seria o mais beneficiado pela disseminação de notícias falsas.

Correndo contra o tempo, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a Polícia Federal estão organizando um grupo para discutir como evitar a proliferação dessas notícias para tentar reduzir seu potencial impacto nas urnas.

Entretanto, acadêmicos e advogados das áreas de tecnologia e do direito eleitoral alertam para os riscos de, sob o pretexto de combater notícias falsas, a livre circulação de ideias e a liberdade de expressão serem prejudicadas. Há ainda o risco do uso político desse tipo de controle ou mediação por parte de candidatos que se sentirem prejudicados pela divulgação de informações incômodas, mas não necessariamente falsas.

Em entrevista à Folha de São Paulo, Cristina Tardáguila, diretora da Agência Lupa, especializada em checagem de fatos, destacou que o Brasil tem atualmente apenas três agências independentes de checagem de fatos ("fast checking"), enquanto os Estados Unidos contavam com 40 em 2017.

Para tentar identificar as notícias falsas, ela dá algumas dicas, como desconfiar de informações sem fonte identificada. E mesmo nos casos de fontes de confiança, é necessário prestar atenção ao endereço eletrônico dos sites (URL) para ter certeza que não está navegando em um "fake site" que imita a página de um outro veículo.

Na matéria da Folha, Cristina lembra do caso de Fabiene Maria de Jesus, que foi linchada e morta por moradores do Guarujá após ter uma foto sua publicada em página do Facebook e ser acusada erradamente de ser uma sequestradora que nunca agiu no município. "Informação falsa mata de forma agressiva, como no caso de Fabiene de Jesus, ou de forma lenta, como no caso de uma eleição presidencial", concluiu.

Fonte: CNseg | Selective Exposure to Misinformation: Evidence from the consumption of fake news during the 2016 U.S. presidential campaign
Folha de São Paulo