Entrevista com Jorge Maranhão - Cidadania e sustentabilidade. Tem tudo a ver

 Fundador de A Voz do Cidadão - Instituto de Cultura de Cidadania, novo parceiro da CNseg no âmbito da divulgação institucional do seguro, o especialista em comunicação corporativa Jorge Maranhão aborda, nesta entrevista, a importância da cidadania para um mundo mais sustentável.

CNseg Sustentabilidade: Hoje, um conceito muito difundido nos mercados é o de responsabilidade social. Mas, aos poucos, outro conceito, mais abrangente, vem ganhando força: o de “cidadania corporativa”. Qual é exatamente a relação entre eles?

Jorge Maranhão: Falar de “responsabilidade social” é fácil. Todos os dias nos deparamos com esta ou aquela definição que, em suma, trazem a ideia do compromisso que cada empresa ou entidade tem para com o todo da sociedade nas mais diversas questões, como meio ambiente, segurança, saúde, consumo consciente, educação etc. Aos poucos, com o fenômeno da globalização - não só de mercados e produtos, mas também de idéias, opiniões e informação - passa a surgir em todo o mundo uma consciência mais clara da importância de temas que funcionem melhor nesta nova realidade, como bem estar comum, governança, accountability, sustentabilidade e outros.

Como se pode perceber, são temas que, para além de responsabilidade social e ambiental, exigem responsabilidade política. Quando já não basta mais a conduta individual de pessoas ou grupos de pessoas, mas se torna urgente como uma ação política coordenada de monitoramento, pressão, fiscalização e parceria entre todos os segmentos envolvidos, como o poder público, os agentes reguladores, os operadores da justiça, as empresas ou entidades empresariais e, sobretudo, as organizações sem fim de lucro da sociedade civil, consorciados em redes e parcerias entre o segundo e o terceiros setores. Trata-se de “cidadania corporativa” – corporate citizenship na sua acepção de origem - quando quem assume o protagonismo desta sinergia de compromissos, de controle social das políticas públicas, são agentes privados.

Vale a pena frisar que, quando nos referimos à política, estamos longe de nos referir ao jogo político-partidário e eleitoral do dia a dia ou da política de representação formal. Estamos falando de uma relação acima disto e que prevê o estabelecimento conjunto de metas de atuação pública, de controle sobre programas de governos, sobre a execução orçamentária, de ampla discussão sobre marcos regulatórios, de moralidade e ética públicas, de celeridade da justiça e de tudo o que significa uma relação aberta e transparente entre os três setores da sociedade, com a devida cobertura da mídia. Seja através de instituições de Estado dedicadas ao controle econômico-financeiro (TCU, CGU, AGU, Banco Central), à regulação de mercado, à defesa dos interesses difusos da sociedade (Ministério Público) ou da justiça comum.

CNseg Sustentabilidade: Quando a questão é a sustentabilidade, ou mesmo a defesa do meio ambiente, um dos pontos críticos é a pressão da judicialização de conflitos ou interesses, o que gera custos para a Estado e incerteza jurídica nos mercados. Apenas a regulação é suficiente, do ponto de vista de uma cidadania corporativa?

Jorge Maranhão: Evidentemente, a regulação é imprescindível. Sem ela, o Estado é levado a processos judiciais de custos imprevisíveis. Mas não é suficiente. Sabemos que a força de pressão de agentes econômicos de visão imediatista e estreita sempre vai atuar com eficiência para interferir no processo regulatório. Mas existem outros caminhos para além da boa regulação, como o investimento em políticas tributárias mais eficientes, de estímulos aos agentes econômicos engajados na cidadania corporativa, e de auditoria eficaz e de penalizações maiores sobre agentes econômicos predadores, cujos crimes de concorrência desleal, formação de cartel, pirataria e contrabando, terceirização de sonegação fiscal, corrupção ativa e outros, se caracterizam como verdadeiros crimes de lesa-cidadania.

Mas o principal é que o Estado entenda que o seu papel, a cada dia que passa, é o de garantir justiça e o de regulador. O Estado empreendedor, que investe em empresas privadas ou mesmo que atua diretamente competindo nos mercados, é um anacronismo pesado, ineficiente e insustentável sob qualquer ponto de vista. Uma grande pauta e agenda da aliança entre cidadãos consumidores, pagadores de impostos, eleitores, e cidadãos gestores, produtores e fornecedores de serviços e produtos de empresas sob a égide da cidadania corporativa.

CNseg Sustentabilidade:
O que falta, então, para que governos e instituições de Estado passem a cumprir efetivamente esse papel?

Jorge Maranhão: Em resumo, consciência do que chamamos de “plena cidadania”. É preciso que a sociedade, cidadãos singulares, empresas, entidades empresariais e associações civis entendam o seu papel político de controle social sobre governos, orçamentos públicos e mandatos eletivos. Não basta votar em alguém se depois não se sabe como foi o mandato. Ou não basta lutar por isenções tributárias ou incentivos fiscais pontuais, se o processo de regulação ou se os investimentos públicos em infraestrutura ou logística são comprometidos. Ou se as fronteiras são mal cuidadas e abertas a tráfico, contrabando, pirataria e outros crimes.

O cidadão consciente deve ser consciente politicamente. Ele precisa conhecer temas como a organização política nacional e quais os seus deveres para com a sociedade, para só depois se intitular como sujeitos de direitos. Tem que conhecer a importância das instituições de Estado e suas funções, em especial o Ministério Público, os tribunais de contas, as instituições de controle interno, fiscalização e gestão, e, sobretudo, o sistema judiciário e sua essencial importância para a efetiva garantida dos preceitos fundamentais da democracia. Ou seja, ele tem que compreender que o poder público existe para servir mais aos seus interesses e do que aos interesses de políticos ou gestores de momento.

Aqui no Instituto de Cultura de Cidadania A Voz do Cidadão temos observado com bastante clareza que essa cultura de cidadania está tomando corpo mais rapidamente do que vivem a apregoar os céticos e os piadistas de plantão, verdadeiros irresponsáveis políticos e avalistas da cultura de impunidade da minoria de delinquentes da vida pública que querem nos convencer de que esta seja a nossa própria natureza enquanto povo. É crucial no momento político que o país atravessa que os homens de bem mostrem e explicitem as suas causas de interesse público a toda a sociedade através da conduta exemplaridade no espaço público e na mídia. A própria Lei da Ficha Limpa mostra isso, na medida em que foi um projeto de lei saído das entidades da sociedade, ganhou apoio de mais de dois milhões de cidadãos e entrou para tramitação no Congresso com a sintonia irresistível das redes sociais e da própria mídia. Lá dentro, foi aprovado num prazo pequeno para esse tipo de projeto. Através da internet e das redes sociais, das participações em boletins de rádio, do nosso próprio portal e de diversos outros programas de divulgação, educação corporativa, de relacionamento e de mobilização, A Voz do Cidadão tem “conversado” regularmente com perto de dois milhões de cidadãos atuantes. Imagine só: se cada um deles incentiva outros 10 a agirem da mesma forma, teremos um contingente de mais de 20 milhões de pessoas conscientes de seu papel como cidadãos eleitores e pagadores de impostos. É esse tipo de educação política que será capaz de reverter o déficit de cultura de cidadania que ainda temos.

Nós, cidadãos, empresas e entidades, não temos opção: a cidadania corporativa é luta por governança; é a verdadeira garantia de sustentabilidade que, entre outras coisas, poderá viabilizar a nossa permanência neste planeta.

Fonte: CNseg Sustentabilidade em Seguros