Artigo do NYT associa pico de mortes nos EUA aos aplicativos de celulares

O aplicativo Snapchat permite que os condutores postem fotos que registram a velocidade do veículo que dirigem. O aplicativo Waze recompensa condutores com pontos quando eles reportam congestionamentos ou acidentes de trânsito. Até mesmo no jogo Pokémon Go há condutores de veículos motorizados buscando por criaturas virtuais nas rodovias.

O principal problema com condutores distraídos uma década atrás eram as chamadas ou enviando mensagens de texto dos seus celulares. A solução, à época, consistiu na introdução de novas tecnologias que possibilitassem que o condutor mantivesse suas mãos livres para conduzir – wi-fi nos veículos (ou bluetooth) e uma série de novos aplicativos – e conduziram a uma explosão no uso da internet em veículos motorizados que, segundo os especialistas em segurança, estão contribuindo para um aumento do número de mortes em rodovias.

Após quedas contínuas ao longo das últimas quatro décadas, o número de mortes registradas em rodovias no ano passado apresentou o maior aumento percentual nos últimos 50 anos. Além disso, os números provisórios deste ano são ainda piores. Nos primeiros seis meses de 2016, as mortes em rodovias aumentaram em 10,4%, para 17.775, em relação ao mesmo período de 2015, de acordo com a Administração Nacional de Segurança Rodoviária (National Highway Traffic Safety Administration).

“Esta é uma crise que precisa ser tratada imediatamente” disse, em entrevista, Mark R. Rosekind, chefe da agência.

A Patrulha Rodoviária da Flórida está investigando uma colisão que ocorreu em 26 de outubro no Tampa, na qual foram mortas cinco pessoas. Um passageiro em um dos carros, um adolescente, gravou um vídeo no Snapchat mostrando seu veículo sendo conduzido a 115 milhas/hora (o equivalente a 185 km/h) justamente antes da colisão.

Uma ação movida na corte da Geórgia alega que um adolescente envolvido em uma colisão em setembro de 2015 perto de Atlanta estava usando o Snapchat enquanto conduzia a mais de 100 milhas/hora (o equivalente a 160 km/h), segundos os autos do processo. O carro colidiu com o carro de um motorista do Uber que ficou seriamente ferido.

Em outubro, alarmado pelas estatísticas, o Departamento de Transportes elaborou um plano para trabalhar conjuntamente com o Conselho Nacional de Segurança e outros grupos deadvocacy para criar a estratégia “Rodovia para Zero” (Road to Zero), com a ambiciosa meta de eliminar as mortes em rodovias em 30 anos.

O secretário da administração de transportes do governo Obama, Anthony Foxx, disse que o esforço em curto prazo consiste em identificar mudanças nas regulamentações, legislação e padrões que possam ajudar a reduzir o número de mortes. Isso deve incluir um incentivo a todos os estados para tornarem as leis mais rígidas e aumentarem a fiscalização em relação ao uso do cinto de segurança nos automóveis e o capacete nas motocicletas, ao mesmo tempo em que se deve reprimir os condutores distraídos e alcoolizados. O esforço deve também incluir regulamentações mais rígidas para caminhões pesados, segundo Foxx.

Um segundo esforço seria o estabelecimento de metas de longo prazo e a aceleração da inserção das tecnologias de veículos de condução autônoma, as quais muitos especialistas citam como tendo um potencial de prevenir acidentes em função da eliminação do erro humano na tarefa de conduzir.

Uma preocupação, no entanto, é que as gerações atuais dos sistemas de assistência à condução, como o piloto automático, podem induzir alguns condutores a uma falsa sensação de segurança que pode contribuir para a distração ao volante.

A maioria dos veículos novos vendidos hoje em dia possui softwares que conectam-se aos smartphones e permitem que os condutores façam ligações, ditem textos e usem aplicativos sem ocupar as mãos. Os fabricante de automóveis dizem que esses sistemas permitem que os usuários se concentrem na condução enquanto interagem com seus smartphones.

“O princípio geral é possibilitar o reconhecimento da voz dos usuários de modo que eles possam manter seus olhos na via e suas mãos ao volante”, disse Alan Hall, porta-voz da Ford, que começou a instalar sistemas de sincronização nos automóveis em 2007. Desde então, a companhia tem adicionado dispositivos que reduzem as distrações, como o botão “não perturbe”, que permite que condutores bloqueiem o recebimento de chamadas e mensagens de texto.

CarPlay permite o uso da assistente virtual Siri do iPhone para atender chamadas, ditar textos e controlar aplicativos como o Spotify e o Pandora. Os dispositivos de sincronização permitem o uso de menus simplificados no display do automóveis para reduzir a distração do condutor e apagam a tela do celular para evitar que o condutor caia na tentação de mexer no aparelho.

Entretanto, Deborah Hersman, presidente do Conselho Nacional de Segurança, uma organização sem fins lucrativos, e também ex-encarregada do Comitê Nacional de Segurança nos Transportes, disse que não está claro o quanto essas tecnologias diversas reduzem de fato a distração – ou mesmo se, ao contrário, encorajam as pessoas a utilizarem cada vez mais funções de seus telefones enquanto conduzem. E acrescenta, “livrar as mãos dos condutores não significa livrar suas cabeças; é a carga de trabalho cognitiva do cérebro que é a questão”.

As tecnologias em alguns carros novos têm a intenção de reduzir a distração dos condutores ou compensar esse efeito.

Dr. William Chandler, um neurocirurgião aposentado de Ann Arbor, Michigan, comprou recentemente um automóvel que o alerta se ele sai de sua faixa na rodovia ou se há um automóvel em seu ponto cego. Seu dispositivo favorito é a projeção no para-brisa exibindo sua velocidade, o limite de velocidade e informações de navegação. “Isso coloca tudo dentro do meu campo de visão”, afirma ele. “É realmente um fator de segurança contra condutores distraídos, porque nunca estou olhando para o mapa na tela do console”.

Todavia, carros novos correspondem a apenas uma proporção dos 260 milhões de veículos da frota norte-americana.

As companhias de seguro, que monitoram os acidentes de trânsito, estão convencidas de que o aumento no uso de dispositivos eletrônicos na condução é a maior causa para o aumento das mortes no trânsito no país, de acordo com Robert Gordon, o vice-presidente da Associação de Seguradoras de Danos à Propriedade dos Estados Unidos. “Isso é um sério problema de segurança pública para o país”, afirma o Gordon.

Fonte: ONSV - Observatório Nacional de Segurança Viária