As razões da reforma inadiável

A crise do sistema previdenciário decorre de um acúmulo de boas notícias. A afirmação pode parecer paradoxal, mas a insustentabilidade do sistema previdenciário resulta de uma drástica redução da taxa de mortalidade infantil, do aumento da expectativa de vida e da redução nas taxas de fecundidade comparável à dos países desenvolvidos.

A consequência é que essas mudanças combinadas levam a um processo de envelhecimento, projetando uma profunda alteração da pirâmide demográfica. Os indivíduos com mais de 65 anos vão passar de 7,6% da população, em 2010, para 38%, em 2050.

Um estudo da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) mostra que o percentual da população com mais de 65 anos sobre a população economicamente ativa (razão de dependência) passará de pouco mais de 10%, em 2015, para cerca de 40% em 2050. O principal impacto será econômico, afetando os sistemas de saúde e previdenciário.

A análise torna-se ainda mais dramática se consideramos que já partimos de um déficit de 4,5% do PIB. Mas o déficit ê sintoma do problema raiz: o custo elevado e crescente com seguridade social, que já representa cerca de 45% dos gastos da União. Para se ter ideia, os gastos com saúde e educação, somados, representam menos de 15% do orçamento do governo federal.

Embora tenhamos população ainda jovem, com razão de dependência em torno de 10%, gastamos em proporção do PIB o mesmo que Japão, Suécia e Suíça, que têm razão de dependência superior a 30%.

O desequilíbrio financeiro corrente é desproporcional entre setor privado e público. Este alcança um universo de 3,5 milhões de beneficiários e apresenta déficit maior que o do INSS, que atende 27 milhões de pessoas. A revisão dessa distorção ê importante para a sustentabilidade do sistema, para promover desconcentração de renda e para combater a injustiça social produzida por sistemas não isonômicos.

No entanto, pelas projeções de médio e longo prazo, o problema maior reside no INSS, já que as mudanças demográficas alcançam uma população muito maior e produzirão efeito exponencial no aumento dos gastos e no desequilíbrio atuarial. O mesmo estudo da OCDE mostra que o gasto com a previdência (só do setor privado) saltou de 4,6% do PIB, em 1995, para 8,2%, em 2016, e atingirá 17% do PIB em 2060, o que torna urgente a adoção da idade mínima de aposentadoria como providência básica.

A votação da reforma da Previdência, agora prevista para fevereiro, é fundamental para buscarmos um encaminhamento para estes problemas. É preciso ter claro que a incipiente melhora da economia nesses últimos meses está suspensa por frágeis barbantes.

Será impossível equilibrar a situação fiscal sem a reforma previdenciária. O recente rebaixamento da nota de crédito do país pela S8tP é um lembrete de que sem isso, o país não será capaz de criar um ambiente favorável para a sustentação da queda da taxa de juros real no longo prazo, recuperação do grau de investimento, atração de capitais e a tão esperada retomada da atividade econômica e do crescimento da renda e do emprego.

Esse é um assunto difícil de tratar em qualquer lugar do mundo. São medidas em favor da população, mas impopulares. É o momento de um debate intelectualmente honesto e apartidário, no qual toda a sociedade se engaje com o devido senso de urgência para decidir qual legado deixaremos às gerações futuras.

Sem mudar a Previdência, será impossível equilibrar a situação fiscal; é hora de um debate intelectualmente honesto e apartidário.

EDSON FRANCO é presidente da FenaPrevi (Federação Nacional de Previdência Privada e Vida) e CEO da Zurich Seguros no Brasil

Fonte: FenaPrevi