Moedas. Um artigo difícil de achar

BRASÍLIA - Quando o freguês chega ao caixa para pagar pelos pãezinhos que acabou de comprar, a atendente Ana Alice Souza Braga, 40 anos, sabe que não terá o troco exato para devolver. Então, aplica a matemática do arredondamento: se a conta é de R$ 4,52, deixa por R$ 4,50. Se for de R$ 4,53, sobe para R$ 4,55, esperando que o cliente concorde.

Trabalhando como caixa numa padaria, Ana Alice argumenta que pratica a equação de consenso. Tudo porque as moedinhas de R$ 0,01 deixaram de ser cunhadas em 2005, por determinação do Banco Central (BC), e se tornaram raras. As de menor valor hoje são as de R$ 0,05.

– Quem já é cliente sabe que é compensação – diz Ana Alice.

A falta de troco vem exigindo improvisações por parte dos comerciantes, especialmente os que vendem mercadorias pesadas na hora, como pão, carne, frios, queijo, hortigranjeiros e frutas. O Banco Central, no entanto, garante que não há desabastecimento. Informa que existem 22,4 bilhões de unidades em circulação, o que representa 112 moedas para cada brasileiro. Conforme o BC, essa média per capita se equipara a padrões internacionais.

Mas, então, por que as moedas parecem escassas? A explicação pode não convencer, mas estaria no hábito das pessoas de guardar o troco em cofres ou esquecer de levar as niqueleiras para pagar as compras. O presidente da Associação Gaúcha de Supermercados (Agas), Antônio Cesa Longo, diz que são feitas promoções para captar troco. Há comerciantes oferecendo sacola sustentável ou chocolate se o freguês pagar o equivalente a R$ 10 em moedas. Outro recurso é estimular o pagamento eletrônico, com cartões de crédito e débito.

Troco solidário gerou discórdia

Uma das estratégias foi bolar o troco solidário, no qual os consumidores são convidados a doar centavos para instituições de saúde. Durante dois anos e oito meses uma grande rede de supermercados arrecadou R$ 767.223,75 para três hospitais. No primeiro semestre de 2013 a empresa terminou com a promoção e prefere não se manifestar a respeito. A Agas, porém, constatou que 40% dos clientes rejeitavam a forma de doação.

Outros setores também se viram na busca de níqueis. Como os bancos fornecem apenas um terço das moedas de R$ 0,05 e R$ 0,10 de que necessita, a Concepa, concessionária de pedágio, orienta as atendentes das praças a negociar o troco com os motoristas. Também incentiva a passagem automática através da leitura de chips, que aumentou de 19,9% (2012) para 22,3% (2013).

Nem sempre malabarismos contábeis são aprovados. Na padaria onde Ana Alice trabalha a colega de função, Flávia Alessandra Pereira, 18 anos, já levou broncas. Certa vez explicou a um cliente que não tinha dois centavos de troco, que ficaria devendo a importância. Então ouviu a réplica:

– Se você pode me dever dois centavos, por que eu não posso ficar te devendo três centavos?

Como parte do princípio de que o freguês sempre tem razão, Alessandra deu-lhe R$ 0,05 e assumiu três centavos de prejuízo. Pode ter uma quebra de caixa de R$ 3 ao dia.

Fonte: Jornal de Santa Catarina