1ª Palestra do Ciclo de Ouvidorias
No que depender do segmento de bancos, os órgãos de defesa do consumidor receberão cada vez menos demandas de clientes bancários. Para tanto, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) tem investido desde 2007 na implantação do Sistema de Autorregulação Bancária, que inclui, entre outras ações, a oferta de canais diversos para o recebimento de demandas de consumo, que são monitorados e mensurados por meio de indicadores, a padronização da comunicação com o cliente e a criação de um setor exclusivo para o relacionamento com os órgãos de defesa do consumidor.
“O objetivo dessas iniciativas é mudar a imagem do setor perante os órgãos de defesa do consumidor e, ainda, melhorar a qualidade de produto e atendimento dos bancos aos clientes”, disse Gustavo Marrone, diretor de Autorregulação da Febraban, que, juntamente com outro diretor da entidade, Sérgio Gianella, participaram da 1ª Palestra do Ciclo de Ouvidorias. O evento foi realizado nesta quarta-feira, 27 de fevereiro, no auditório do Sindicato das Seguradoras de São Paulo (Sindseg-SP), sob a coordenação das Comissões de Ouvidoria e Relações de Consumo da Confederação Nacional das Empresas de Seguros (CNseg).
Sequelas da Adin
Gustavo Marrone contou que o tema “relacionamento com o cliente” entrou na agenda do setor bancário depois de um episódio marcante ligado à entrada em vigor do Código de Defesa do Consumidor, na década de 90. Segundo ele, na época, o setor financeiro questionou na Justiça a aplicação da Lei do Consumidor por meio de uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin), que foi mal recebida pela sociedade. “Aquela contestação criou sequelas até hoje perenes em nosso relacionamento com órgãos de defesa do consumidor, que sempre relembram esse fato”, disse.
Depois do desfecho da Adin, em 2006, a Febraban decidiu, segundo ele, “suprir o déficit” com os órgãos de defesa do consumidor por meio da criação de uma nova estrutura de relacionamento. “Por este meio se pretendeu transmitir à sociedade que o respeito ao consumidor foi incorporado como um princípio básico do negócio bancário”, afirmou. A contratação de um especialista da área técnica para iniciar o trabalho de relacionamento com os órgãos do consumidor, em 2007, foi o primeiro passo para a criação no ano seguinte do Sistema de Autorregulação, que entrou em vigor em 2009. Gustavo Marrone, Sérgio Gianella e mais quatro profissionais atuam na diretoria de autorregulação, responsável por normas e qualidade.
Segundo Gustavo Marrone, custou muito esforço de sua área para tentar mudar a visão dos órgãos de defesa do consumidor em relação ao setor bancário. “O Procon trata da patologia, daquilo que deu errado, mas não entende do produto, daquilo que dá certo. O que dá errado é apenas uma pequena parcela do negócio, que serve de notícia para a imprensa”, observou. Ele conta que a mudança começou a partir de ações afirmativas, mostrando o lado positivo do setor. Além de visitação trimestral ao Senacon e Procons, o setor de relacionamento com esses órgãos também participa de mutirões para renegociação de dívidas.
Uma dessas ações foi a própria criação do Sistema de Autorregulação, que conta, atualmente, com a adesão voluntária de 18 bancos, responsáveis por 90% do setor. Outra iniciativa positiva, na avaliação do diretor, foi a criação de um selo de autorregulação, que, por enquanto, não foi lançado oficialmente. Por hora, o grau de adequação dos bancos aderentes às regras de autorregulação está em torno de 90%, de acordo com o monitoramento da Febraban. “Lançaremos o selo quando tivermos um grau ainda maior de adequação para não comprometer a sua credibilidade”, justificou.
Normativas
As regras de autorregulação bancárias são estabelecidas por normativas, do número 1 ao 8, editadas a partir de 2008. A primeira trata dos princípios de relacionamento com o cliente. A normativa 2 é mais “emblemática”, segundo Gustavo Marrone, porque envolve um problema que durante anos gerou demandas nos Procons. Trata-se do encerramento de conta bancária, que no passado, ele reconhece, gerava muita demanda. “Hoje, esse problema inexiste. Um sinal de que a normativa está funcionando”, afirmou.
A normativa 3, de 2009, surgiu em função do decreto do SAC, seguindo as orientações da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon). Sérgio Gianella informou que, além do monitoramento semestral do SAC, a entidade possui contrato com empresa de cliente misterioso. “O cumprimento da regra é altíssimo”, garantiu. Agora, o SAC já está entrando em sua segunda fase, na qual a métrica deixa de ser o prazo de atendimento para focar apenas na resolutividade.
“Para o consumidor, o prazo importa pouco, o importante é resolver. Se não resolver, o canal não funciona e ele procurará o Procon”, disse, acrescentando que, hoje, a métrica SAC na Febraban é a que mais importa. Tanto que a entidade criou indicadores setoriais de atendimento às demandas, que incluem SAC, Fale Conosco, agências, Ouvidorias e outros, revelando a performance de cada um. “Os indicadores falam por si, sem que precisemos dizer ao Procon se o SAC funciona ou não”, disse Sérgio Gianella.
As regras para evitar filas nos bancos foram tratadas pela normativa 4, que incluem comandos para acessibilidade, acesso, estrutura da agência, banheiros, cadeiras etc. Em uma pesquisa por amostragem com 10 mil agências em 2011, o resultado indicou que 15% das agências não cumprem o tempo de fila, a maioria na Região Sudeste. Mas, curiosamente, não é desta região que parte a maior quantidade de demanda, mas da Nordeste.
Uma das soluções criativas da Febraban para se relacionar com seus clientes pelo canal internet e “concorrer” com o site “Reclame Aqui” foi a criação do “Conte Aqui”, regulamentado pela normativa 7, de 2011. Semelhante a um canal de recebimento de denúncias, o Conte Aqui atende pelo 0800 e pela internet as queixas de clientes contra bancos, atualmente, de forma individual. De acordo com a norma, para que a reclamação seja enviada à Ouvidoria da Febraban, o cliente precisa consentir. “O ConteAqui atende as demandas não resolvidos por outras instâncias, para não canibalizar os canais de atendimento dos bancos”, explicou Gustavo Marrone. Ele informou, ainda, que o resultado é positivo e tem servido para evitar que as demandas extrapolem para fora do setor bancário.
Um dos resultados do trabalho da Ouvidoria foi a padronização da Unidade de Resposta Audível (URA), que passou a seguir um script único em todo o sistema, desde a numeração das opções de atendimento até a inclusão de pesquisa de satisfação por atendente e por resolutividade. “A comunicação precisa ser clara, porque se não fizermos isso, alguém fará por nós”, disse referindo-se à possibilidade de criação de decreto semelhante ao do SAC.
Uma das novidades apresentadas por Gustavo Marrone, que classificou como “a cereja do bolo”, é a criação da mais nova norma de crédito, ou o chamado crédito responsável, que disciplinará toda a parte de publicidade e oferta, contratação e, ainda, tratamento das pessoas endividadas e superendividadas. Ainda em fase de construção, a nova norma contou com a colaboração do professor Ricardo Morishita. “É uma proposta ousada e que se for aprovada pelo Conselho, talvez seja a maior contribuição que os bancos poderão oferecer à sociedade”, disse.
Fonte: CNseg